CAPÍTULO 02

Apartheid brasileiro 

Master Drin


Apartheid é o nome dado à segregação racial institucionalizada na África do Sul à partir de 1948 e o termo sigmfica "Desenvolvimento separado das raças". Os habitantes eram classificados desde seu nascimento, em pretos, brancos, mestiços e indianos. De acordo com a classificação, o cidadão sul africano teria melhores ou piores condições de vida, sendo a cor da pele determinante para a qualidade da educação, saúde, restaurantes, lugares nos ônibus e todos os outros serviços públicos. Se você acha que o fato de ser um país do continente africano e de ter maioria da população negra alterou a lógica histórica e pessoas brancas tinham os piores serviços, você está muito enganado, as regalias e serviços de qualidade eram exclusividade dos colonos holandeses e pessoas pretas só tinham acesso aos piores serviços.


Mas os ambientes mais ricos eram habitados pelas pessoas pretas... para

trabalhar e realizar justamente os serviços de qualidade.


Quando pensamos em um período histórico nos assustamos com as fotos e relatos mais marcantes, uma vez que é justamente o que fica para a história, mas com isso não percebemos as semelhanças com o nosso tempo. É claro que casos extremos aconteceram na história. No período do Apartheide tinha placas nas ruas, nos ônibus, nas praias indicando onde era permitido ou não para cada pessoa baseado na cor da pele, bem como nos EUA entre os anos 1870 e 1960 com quase 100 anos das leis Jim Crow que impuseram a segregação em escolas, ônibus e todos os serviços... igual no apartheid da africa do sul. Mas será que não vivemos exatamente a mesma situação somente sem as placas? Somos classificados ao nascer de acordo com a cor da pele, a quantidade de dinheiro na conta dos pais e o local onde nascemos, como disse o presidente Lula em importante discurso na abertura da 78º assembleia da ONU em setembro de 2023


"O destino de cada criança que nasce neste planeta parece traçado ainda no ventre de sua mãe.

A parte do mundo em que vivem seus pais e a classe social à qual pertence sua família irão determinar se essa criança terá ou não oportunidades ao longo da vida. Se irá fazer todas as refeições ou se terá negado o direito de tomar café da manhã, almoçar e jantar diariamente. Se terá acesso à saúde, ou se irá sucumbir a doenças que já poderiam ter sido erradicadas. Se completará os estudos e conseguirá um emprego de qualidade, ou se fará parte da legião de desempregados, subempregados e desalentados que não para de crescer. É preciso antes de tudo vencer a resignação, que nos faz aceitar tamanha injustiça como fenômeno natural. Para vencer a desigualdade, falta vontade política daqueles que governam o mundo."


O apartheid brasilero fica visível até na hora de se divertir... tem festa de branco e festa de preto, tem bar que vai mais preto e bar que vai mais branco... Isso é geral e, igual no tempo do apartheid da africa do sul, quem trabalha pra tudo isso acontecer não e a população branca.


Óbvio que eu to falando de questões estatísticas e a maior parte do mundo atualmente acharia inaceitável uma segregação institucionalizada, sendo todo meu argumento questionável ao ser confrontado com um exemplo pessoal de uma pessoa branca extremamente pobre ou uma pessoa preta extremamente rica. Isso é incrível… saber que a questão racial não é legalmente um impeditivo para a ascensão social é um avanço, sem dúvidas. Mas quando olhamos de longe, a realidade geral é evidente. São infinitos dados e estatísticas das principais fundações, institutos e organizações do país, mas nada explica melhor essa situação do que dois memes específicos: 1º a comparação entre duas fotos, uma de uma turma de medicina se formando e outra de uma equipe de garis no início do expediente onde na primeira foto todos eram brancos e na segunda eram quase todos petos. O 2° meme são fotos de câmaras de deputados e reuniões de líderes globais, empresários e outras pessoas poderosas onde com edição de imagem retira-se todas as pessoas brancas das fotos e o que temos são fotos de salas vazias ou com 2 a 3 pessoas não -brancas. Esses memes deixam evidente o que é óbvio, mas vamos aos dados :


Negros são 56% da população brasileira, portanto não é possivel chamar de minoria.


Graças às políticas públicas quase 100% das crianças são matriculadas no ensino fundamental, mas será que a educação é igual? 


Ao final do 9° ano, 32% das crianças brancas têm aprendizagem adequada em matemática, apenas 12% das crianças pretas atingem o mesmo nível de aprendizado. Isso porque existe um acesso diferenciado à infraestrutura de qualidade para as escolas e dentro de casa as condições também são muito diferentes.


No ensino médio a realidade muda... pra pior: menos de 60% dos jovens negros concluem essa etapa, já os brancos são 75%. E o problema não é só de acesso. No ensino médio também ocorre defasagem de aprendizagem onde 40% dos alunos brancos adquirem os conhecimentos adequados de Português, o que é realidade para apenas 21% dos jovens pretos. (Dados do Todos Pela Educação de 2020).


As estatísticas da educação se refletem no mercado de trabalho onde pessoas brancas tem média salarial cerca de 40% maior que pessoas pretas, e esse dado piora, aumentando para 50% no caso de trabalhadores com ensino superior. (Dados do IBGE de 2022)


Lembrando que esses dados são sobre salários.


Ainda de acordo com o IBGE, em pesquisa de 2016, entre as pessoas mais ricas do Brasil, apenas 17% são pessoas pretas, lembrando que 56% do brasil é preto. Já entre os mais pobres, TRÊS em cada QUATRO. são pessoas negras. E é aí que a gente volta pros memes que eu falei. E Não basta só criar as cotas se uma faculdade de medicina tem livros caríssimos e exige tempo livre de sobra sendo que isso é negado à uma parcela da população. Óbvio que na foto de formatura do curso só vai ter brancos, porque somente a

parcela mais rica e, como vimos nas estatísticas, mais branca, consegue arcar com os custos da faculdade.


3 em cada 4... 75% da população mais pobre é preta e “somente” 80% da população mais rica é branca.


Nesses dados, quando falo mais ricos, me refiro ao 1% da população que recebe acima de R$260 mil por ano (cálculo de IPEA e do IBGE).


260 mil por ano.


Entre os bilionários, simplesmente NENHUM negro figura a lista dos 54 brasileiros e, assustadoramente, só 11 pessoas pretas estão entre os quase 2 mil billonários de todo o planeta - de acordo com a Forbes. Mas focando no Brasil... A esmagadora maioria das pessoas pobres são pretas e absolutamente nenhum bilionário brasileiro é preto.


Se não temos as tais placas que separavam por cor o povo sul africano no apartheid, temos as placas que nos dividem em classes sociais como, por exemplo, o elevador de serviço e o elevador social, a entrada de serviço nos fundos e o saguão principal e, se já vimos que há uma relação direta entre cor e classe social, estas placas acabam por realizar o mesmo objetivo final: separar pessoas pretas de pessoas brancas. (Vale aqui ressaltar que em casos comuns de racismo uma pessoa preta ao utilizar socialmente um elevador para adentrar à própria residência, local de trabalho ou visitar um amigo é indicado ou até forçado à utlizar o elevador de serviço). Da mesma forma se compendemos a relação entre cor e renda, fica evidente também que exista supermercado para brancos e supermercado para negros, onde um tem produtos orgânicos caros e o outro tem produtos ultraprocesados baratos. Tem saúdo para branco no hospital com chafariz na entrada e hospital pra preto com goteira no teto. Tem escola pra branco com professor gringo usando quadro smart touch screen e ecola pra preto faltando giz… e prefessor! 


Visualmente, e na prática, vivemos exatamente o que foi vivido na África do Sul durante o apartheid e nos EUA no tempo das leis Jim Crow. E talvez de uma forma mais difícil de enfrentar, uma vez que não é institucionalizado e, portanto temos leis que criminalizam o racismo, impedem a diferença salarial e podemos criar 1 milhão de leis para combater a desigualdade, mas nada vai mudar enquanto o problema estiver na base, já na hora que a criança nasce.


No primeiro episódio falei sobre a importância da política e só teremos mudanças com pessoas pretas participando das tomadas de decisão. Nesse episódio foquei na questão racial, mas o mesmo vale para todas as parcelas da população histórica e atualmente segregadas. Precisamos da atuação direta das mulheres, das pessoas pretas, dos povos originários, da comunidade LGBTQIAPN+ e todos os grupos minorizados e marginalizados. Somente assim vamos começar a quebrar os muros invisíveis que oprimem nosso povo.


A liberdade começa agora! Nesse exato momento tem pessoas incríveis pensando isso e trabalhando pela mudança... recomendo que você conheça Ailton Krenak, Marina Silva, Erika Hilton, Sâmia Bomfim, Dani Balbi, Yuri Moura, Jandira Feghalli, entre outros, que são pessoas que todos os dias tentam quebrar um tijolo desses muros que nos cercam.