CAPÍTULO 01 

Política é importante

Master Drin


Às vezes é difícil entender que a política é importante na nossa vida porque essa palavra é vendida pra gente como se a parte das decisões fosse apenas a política institucional. O que chega pra nós é que política é coisa de velho branco rico de terno lá em Brasília, mas quem quer que você pense assim já entendeu que não é isso e você tem que entender também!


Política é a rua onde mora o rico ter iluminação e a sua não. Quem subiu no poste pra instalar a iluminação de led mais moderna foi você, quem contratou seu serviço foi a prefeitura, então você mesmo se paga para colocar o led no poste e quem recebe a luz e vai poder andar com segurança à noite é o cara rico, quando você volta pra casa sua rua continua sem iluminação ou com o poste mais antigo da cidade com mais pipa que fio.


Política é o saneamento básico padrão FIFA no bairro rico onde quem entra no esgoto pra fazer manutenção é você e na sua rua tem um valão, sendo que você pagou pelo saneamento básico de toda a cidade.


Até o ônibus no bairro rico é melhor, mesmo os ricos não usando, mas vai que precisa né? Tem que tá novinho... até a central, da central pro teu bairro o ônibus é o mesmo desde 1910... Já é sorte se ele chegar no ponto final.


Eu posso pegar aqui qualquer serviço público: a UPA é melhor no bairro rico, o colégio, a coleta de lixo, segurança pública etc, etc e etc.


Isso acontece porque não fazemos parte das decisões. Somos os principais atores políticos porque sem nossas mãos a cidade não trabalha, sem nossas pernas o país não corre e sem a nossa força o mundo não gira. Então nós temos que participar das decisões. Mas temos que entender de uma vez por todas que participar das decisões não é só ser presidente, deputado ou prefeito. Grupos da direita e grupos religiosos com interesses políticos se mobilizaram esse ano para eleger a grande maioria dos conselheiros nos conselhos tutelares do país inteiro e esses mesmos grupos elegeram em 2020 milhares de vereadores e em 2022 centenas de deputados federais, senadores, e todos os outros cargos, seja do legislativo, do judiciário e muitos no executivo.


Vamos fazer uma conta básica: Uma famlia de pessoas pretas moradoras de uma favela do Rio de Janeiro é acusada de mals tratos com a filha criança e, ao visitar a casa, o conselheiro tutelar - de direita e evangélico - descobre que a familia é candomblesista e a criança participa das celebrações. Em um mundo normal o conselheiro tutelar pediria desculpas pelo inconveniente (e se fosse eu ainda faria uma denúncia de intolerância religiosa contra o denunciante da família caso ficasse constatado que a denúncia foi por esse motivo). Mas em uma situação onde o conselheiro tutelar é extremista religioso, a maioria dos vereadores também e até o prefeito… esta família estaria encrencada.


Participar das decisões é trabalhar no CRAS. No conselho tutelar, nas secretarias municipais, na UPA, imagina… O preconceito de uma pessoa que trabalha na UPA seja na segurança, na enfermagem ou até na diretoria, pode ser a diferença entre a vida e a morte de uma pessoa. E se você for se ligar não é impossível ser vereador, deputado e até presidente. Só que pra isso temos que entender a importância dos partidos, dos sindicatos e da luta coletiva. Nas igrejas evangélicas os líderes religiosos indicam candidatos e os fieis formam um grupo unido em torno de uma causa, mesmo que pessoalmente discordem de uma ou outra ideia do candidato. Nós da esquerda queremos ser tão corretos que a gente faz o contrário... A gente espera o partido escolher um nome e começamos a procurar todos os erros dele e nós mesmos apontamos esses erros, dando mais munição e argumentos pros adversários políticos.


Ah, Drin, mas então eu tenho que pagar pau de político? Não! De jeito nenhum! Só que a gente tem que entender que isso acontece e se você tá tão insatisfeito com o político que foi eleito, arregaça as mangas e bora trabalhar porque você também pode ser eleito!


O que temos que parar de fazer é bater no Lula em um mundo onde existe Bolsonaro, temos que parar de falar mal do pastor Henrique Vieira em um mundo onde existe Marco Feliciano, temos que parar de falar mal ou buscar erros no discurso do Boulos, do Galo, do Renato Freitas, da Erika Hilton em um mundo onde existe Nikolas Ferreira, Jorge Seif, Ricardo Sales, Edir Macedo e tantos outro inimigos da comunidade lgbtqiapn+, das mulheres e dos povos historicamente oprimidos. Não é fechar os olhos pros erros dos políticos de esquerda, o lance é: Se tu for de esquerda e quer falar mal... se filia a um partido que você concorda e discute internamente. Se for falar em público, fala mal de quem tá nesse exato momento votando contra o casamento lgbtqiapn+ ou votando a favor do marco temporal e deixa que eles falem mal da esquerda. Porque senão fica nós falando mal de nós e eles falando mal de nós e rindo da nossa cara.


Digo isso porque você tá muito enganado se você acha que não tem debate, discussão e até briga nas reuniões e assembleias dos partidos... mas democracia é isso: A maioria concorda com um projeto e a minoria se junta na luta por um objetivo em comum a todos.


No livro Como As Democracias Morrem, Levitsky mostra como a existência dos partidos é justamente o que impede o nascimento de um político autoritário, uma vez que é muito mais fácil surgir UM ditador de que vários golpistas dispostos a cometer crimes em nome de um ditador, prova disso é que o ex presidente Jair Bolsonaro não conseguiu criar um partido e teve que se filiar a um partido já existente o que, de certa forma, na medida do possível, conteve algumas de suas maiores loucuras. A existência de um partido é o que faz a sua dor encontrar outra dor parecida com a sua, mas não igual e por isso é tão importante, porque duas dores juntas encontram uma solução para todos. Não adianta pegar um tijolo da casa do vizinho pra cobrir o buraco de bala na sua parede, o que adianta de fato é você e seu vizinho juntos lutarem contra a violência no seu bairro, depois na cidade, no estado e no país.


Quando o Lula foi no PodPah (e na biografia dele você também encontra essa história), disse que antes de criar o PT ele odiava política institucional e antes, ainda mais novo, ele não gostava nem de sindicato. Conforme ele foi se envolvendo com as lutas dos operários ele acabou se sindicalizando e com o tempo se tornando uma liderança sindical. Com isso ele um dia foi na câmara dos deputados e viu uma realidade que não tinha nada a ver com a realidade do Brasil: ele viu 99% de patrões e 1% de trabalhadores na casa onde são tomadas as decisões que afetam a vida do país, que é 99% de trabalhadores e 1% de patrões. Com isso ele pensou o óbvio: Preciso criar o Partido dos Trabalhadores. Ou seja, se não gosta do que tá vendo, faz você!


Se você acha injusto crianças pobres serem tiradas de suas famílias porque a mãe fumou um cigarro de maconha anos atrás, enquanto crianças ricas têm seus direitos garantidos... independentemente da situação.... se for pai e mãe pra reabilitação por causa de surtos de uso abusivo de drogas a criança rica fica com uma avó, uma tia mais rica ainda… Se isso te causa indignação você pode se candidatar pro conselho tutelar que eu voto em você.


Se você acha injusto uma pessoa jovem e pobre ser internada compulsoriamente porque usou um grama de alguma droga enquanto um jovem rico faz assédio coletivo na faculdade de medicina, vai pra festa usar êxtase e no dia seguinte assina o laudo de sanidade mental da pessoa pobre prestes a ser internada... se você acha into injusto você seria uma pessoa incrível na assistência social.


Deputado é quem faz lei, só isso... A política muito mais!


É o catador de material reciclável autônomo que participa ativamente da política em diversos âmbitos e mesmo sem perceber está sendo mais importante na luta contra o aquecimento global do que o Elon Mark criando carro elétrico. É o funcionário público concursado que realiza o controle da dengue, é a zeladoria da unidade básica de saúde, é a manutenção da via, é o banco do ônibus saindo do lugar e a janela que na fecha no dia de chuva, é a abordagem policial seletiva, é a praia limpa, é a sirene que toca avisando que a chuva é forte, é a escola, o evento de dia das crianças na praça, as luzes do natal, política é o cheiro de esgoto, é a falta de árvores no bairro pobre e a arborização no bairro rico, política é o alimento ultraprocessado no mercadinho do bairro e o produto orgânico no bairro rico e tudo isso acontece porque a gente não faz parte da tomada de decisões.


Recomendo que vocês conheçam o trabalho da Dani Balbi, do Renato Freitas e da Erika Hilton pra vocês entenderem que é difícil, que é quase coisa de sonhador acreditar que é possível... mas é! Você só precisa entender qual é a sua luta e onde você vai ser mais necessário. Nem todo mundo tem que ser deputado pra participar da política... encontra seu lugar nessa luta, seja dentro ou fora do poder público.


Se você quer que as coisas mudem..... mude!